sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Romance

Vago vagueio pela vaga cidade. Tem contornos de cidade fantasma. Conheço-lhe os contornos e o cheiro que sempre lhe foi característico. Está sombria e povoada de névoas. As portas ouvem-se bater ao sabor do vento que lhes toca - umas vezes mais fortes que outras - e rangem como num filme de terror, mas desta vez multiplicadas por mil. Mais de mil. Como as gotas de chuva que começavam a cair à minha volta. A névoa esvai-se em água com odor a avelã. Escorre-me pelo cabelo, rosto e roupa. Encharcado. Não quis saber. Permaneci estático debaixo daquela nuvem.
Observava o teu sorriso; a tua magia e o teu encanto. Hmm... A tua... beleza e o teu carisma. Era assim que me tinhas cativado. Não creio que fosse preciso a cidade estar fantasmal para sobressaíres, mas assim ficaste mais exposta. Talvez por isso te tenha descoberto. E agora... Tu? Não podes ser tu. Não existes assim. Não te vi antes. Passava ali imensas vezes. Estranhei a tua presença como agora estranho as tuas ausências.
Continua a chover. Mesmo depois da nuvem desaparecer.

(continua)

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Abecedário

(Disseram-me uma vez que os números eram uma coisa muito séria. Decidi brincar com as letras.)

João (nome próprio comum)

Ambicioso. Apaixonado. Bonito. Culto. Diferente. Especial. Fofo. Feliz. Guloso. Humm... Honrado. Herói. Inteligente. Jooo... Jovial. Leal. Manhoso. (Alguém há-de entender. Alguém que não eu) Nobre. (da parte da mãe) Optimista. (da minha parte) Ponderado. Perfeito. (yeah right) Querido. Responsável. (da parte do pai) Sábio. Sensato. Simpático. Sentimental. Sadio. Tímido. Teimoso. Talentoso. (acho eu) Único. Vaidoso. Valioso. Vulnerável. Xenófilo. (de alguns) Zeloso.


(particularidades?)

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Exercício Progressivo

Palavras de amanhã. Sopradas por agora. Dentadas na maçã. Que nos levam daqui p'ra fora. No silêncio do luar. Na escuridão do desejo. Na cumplicidade de um olhar. Nasceu o primeiro beijo. Onde ficou o receio? O medo de amar em demasia. Sem a ansiedade que anseio. Eu queria mas não agia. A vontade ficava. Esperando a oportunidade. E o sono que me embalava. Já pesava na idade.
Memórias esquecidas. Dos sonhos que não permanecem. Lavavam-me as feridas. Das realidades que acontecem. Longas vistas do horizonte. Estranhos ruídos a ecoar. Construída aquela ponte. Por ela vou passar. Termina no fim da rua. O caminho da vida. Se a liberdade vai nua. Eu dou-lhe guarida. Queria querer o que quero. Esperava não esperar esta espera. Sentir a sensação do sentimento sincero. Olhar como quem olha e se apodera. As cores do mundo. Vejo-as todas misturadas. Não passam no fundo. De realidades disfarçadas. Agora que a noite cai. Tudo começa a findar. O eterno amanhã não vai. Sequer poder despertar.

domingo, 7 de novembro de 2010

Um Jardim


Num jardim primaveril
Onde se juntavam amores
Foi com as chuvas de Abril
Que nasceram as flores!

Primeiro as Margaridas
Valiosas como diamantes
Guardavam segredos de vidas
Ali passadas tempos antes.

As Orquídeas vaidosas
Invadidas pelos ciúmes
Aproximavam-se das Rosas
Para lhes roubarem os perfumes!

Pelo meio outras flores já belas
Antúrios, Dálias e outras que tais
Pintavam-se de aguarelas
Para não se sentirem banais.

O Cravo da revolução
Nascido no fim do mês
É esperado com emoção
Que venha nascer outra vez!

Amor-perfeito foi talvez,
O último a nascer,
Mas sabe por sua vez
Que para sempre irá viver!

JD

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Até amanhã

É contigo! É contigo que o meu sorriso permanece eterno. Os teus actos, os beijos e os abraços perpetuados em Nós. Os olhares que se trocam mutuamente e por vezes vejo o que tu vês e tu vês o que eu vejo. E assim quero ficar. Junto a ti. Presente e futuro.
A teu lado, quando as noites brilham mais, a teu lado, quando o sol se envergonha porque juntos temos mais protagonismo do que ele que ilumina e aquece o mundo.
Todas as emoções e sensações que em mim provocas e me fazem sentir-nos a melhor pessoa do mundo. Não eu, não tu, mas Nós.
É contigo! Dia a dia! Lado a lado! Nós! Vivendo juntos até amanhã, e amanhã, e amanhã. Só até amanhã para que possamos aproveitar cada minuto de hoje, e de hoje e de hoje. Um hoje que nunca se repete porque a teu lado tudo é diferente.
Consegues ser diferente até de ti porque me surpreendes constantemente. Fico com desejo que cheguem muitos amanhãs, mas mais desejo ainda que o amanhã nunca chegue ao fim. O nosso amanhã. Não o sinto como meu nem como teu. Tudo é nosso. Tudo pode ser nosso porque juntos tudo conseguimos.
Dia após dia, noite após noite.
E a Nós eu digo que nos amo sem qualquer dúvida. Amo-nos sem qualquer perturbação, sem qualquer limite. Prometo ouvir-nos a uma só voz, calar-nos num só silêncio. Amar-nos nos dois corações.
E assim me despeço sem mágoa e sem saudade, porque é uma mera despedida sem o seu habitual significado. Não tarda estamos juntos de novo e continuamos a ser Nós. Mas com todo o significado eu nos digo: Até amanhã!..

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Leve Estranheza do Ser

(excerto)

...


- Onde vai a vida quando a vemos passar?
- Para o mesmo sítio dos sonhos quando os deixamos morrer.
- E que local é esse?
- O cemitério da memória. É lá que enterramos tudo o que vivemos.
- E o que deixámos de viver?
- Também. Mas isso depositamos em urnas, como que se fosse cremado.
- E é comum as pessoas dirigirem-se a esse cemitério para homenagear e enfeitar as campas e urnas das memórias?
- Não. Fazemos isso com as das pessoas porque nos lembramos delas. As memórias estão enterradas de todo, não nos podemos lembrar.
- Nunca conheci a minha mãe, por isso não me posso lembrar dela, mas visito sempre a sua campa. Sempre a senti. Não podemos sentir as memórias?
- As que vivemos ou as que deixámos de viver?
- Todas. Eu sinto todas!

...

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Mundo

São pedaços de mim que são deixados em todos os locais por onde passo. Vestígios do tempo que passa. Singularidades de que me orgulho. Sobrevivo a todas as intempéries. Revivo-me em cada local constantemente. Solto-me nas brisas que me tocam e deixo-me voar, em corpo, mas sobretudo em espírito. Não é mais do que imaginação, mas não é menos do que um mundo. Um mundo que vou construindo aqui e ali. Por onde habito, onde visito, onde penso. E assim vou construindo o meu mundo, tomando decisões, opções, escolhas, nem sempre as mais correctas, mas sempre as mais acertadas. Em momentos em que a dúvida persiste eu deixo falar os meus sensores e ajo de acordo com eles. Tenho-me dado bem vivendo o que sinto. Talvez por isso me tentem imitar criando cada um o seu mundo, mas não é fácil não tendo em conta que mesmo num mundo só nosso tem de se permitir contacto com os restantes. Só assim é feita vida.

No meu mundo, eu dito as regras, eu escolho os cenários, o tempo, e algumas acções. Escolho até que personalidade quero assumir. Mas quem vai fazer de sol, de lua e decidir de que outros mundos me quero rodear já não sou eu. Vou ouvir os sentimentos!



domingo, 10 de janeiro de 2010

Cidade


Palmilho as ruas da cidade dias e noites. Olho e vejo. Observo. Retenho. Toda a diversidade de cores e de sensações. Todo o mar alto de emoções. A sombra negra dos pombos contrasta esvoaçando na verde relva dos jardins. As pessoas, feitas de uma imensidão de cores e de sentimentos dão vida a paisagens mortas. Janelas com vidros partidos que teimam em permanecer em cacos. Casas antigas desabitadas, casas novas por habitar. A cada canto um prédio antigo repleto de histórias, de sensações e de vidas deixa-se morrer desavergonhadamente à vista de todos. A cada esquina um mendigo, repleto de fome, de frio e de morte deixa-se morrer timidamente à vista de todos. Nada pode ser mais paradoxal. Nada pode ser mais hipócrita.

Acelero os meus passos sem querer, sou levado a fazê-lo pela aceleração que os outros imprimem nas suas vidas, e eu, como os observo deixo-me levar. Nada que eu quisesse fazer, mas inconscientemente acontece. É estranho como a atitude dos outros nos vem influenciar por muito pouco influenciáveis que sejamos. Ou talvez não seja assim tão estranho. Em todo o caso vivemos em sociedade, devemos ter de agir como tal.

Numa outra rua, numa outra hora do dia, já andando em passos mais calmos vejo o sol baixar e reflectir em todas as janelas e em todas as pessoas. Sinto o seu calor aquecer-me como o sentem todos os mendigos, só que eles dão-lhe mais importância. Cada pedaço desta cidade tem o seu pedaço de sol correspondente. Assim como cada prédio tem direito às suas pessoas e como cada pessoa tem direito ao seu prédio. Devia ser esta a lei natural das coisas. Mas falando em lei natural, o dia começa a findar. A escuridão cai sobre toda a cidade, mas para a minimizar acendem-se luzes. Luzes de prédios, luzes de candeeiros de rua, luzes de carros. Pairando sobre mim sinto uma luz forte que penso ser da lua, mas surpreendo-me quando olho para cima e apercebo-me que é apenas um candeeiro de rua com uma luz mais forte que os restantes. E pior que isso, apercebo-me que estive o dia todo sentado num banco de jardim e que não passeei pela cidade, a cidade é que veio passear por mim.