domingo, 5 de junho de 2011

Amanhecer Sofia

Amanhecia Sofia com uma estranha dor que lhe enchia o corpo. Permanentemente estafada de sonhar o que não podia. De sofrer sozinha o que não conseguia partilhar com ninguém.
Em suma, interiorizava em si as dores reflectidas pelas paredes e tecto do seu quarto. A janela entreaberta deixava entrar o frio da neblina que lhe purpurava os lábios. Com o olhar desfocado, Sofia tentava extravasar os sentimentos contidos naquele quarto, o seu mundo, libertando-os de si para o exterior, o mundo alheio. Não obteve contacto. Os olhos, ligeiramente orientais, faziam adivinhar um corrupio de gotas salgadas. Sofia despedaçava-se por cada canto do seu mundo e sombreava-se em cada pedaço do mundo de outrem.
Passavam dias e dias. Meses e meses, anos e anos...

Sofia ali permanecia
E sempre amanhecia
Todo o santo dia
Nem uma vez sorria
Por viver em agonia!

Amanheceu Sofia, finalmente, com um sorriso nos lábios. O cheiro no seu mundo era intenso e nauseabundo. Os seus olhos mantinham-se fechados. Não mais lágrimas corrediças vagueavam pelo seu rosto. O seu corpo imóvel fazia adivinhar um sono profundo e inabalável.
Deixou de lutar. Revelava-se assim o segredo de Sofia.

Sofia já não vivia
Porque não queria
Nem conseguia
Ter mais um dia
Sem companhia!

Um comentário: